16 dezembro, 2018

Outro aniversário



Meu corpo nu hoje está triste.
A minha nuca empurra o crânio para frente,
e minha testa, outrora em riste,
tomba. Vejo os meus pés abaixo e o quanto mentem
'star no chão, 'stão é flutuando,
isso sim; pois é hoje o dia dos meus anos.

Mas, se flutuam pés, o corpo
afunda, pesa e me constrange numa hedionda
bola, na qual o rosto ao dorso
cola-se, e ver-me o umbigo assim, de perto, assombra
os olhos meus, antes distantes.
Miro-me; pois é hoje o dia dos meus anos.

Sou fruto. E o fruto podre não
se faz notar enquanto ele - árvore - inda pende
alto, num galho. Há precisão
de ser mordido, o gosto amargo, o odor pungente
se lhe sentir, ou de, tombando,
partir-se; enquanto o fruto proibido, quando

ainda no pé, já se sabia
proibido. Sou fruto apenas, um mau fruto.
Doem-me as costas porque sintam
como é pesado o tronco ao qual, içado, eu me uno.
Saudades vêm-me de ser plano
outra vez; pois é hoje o dia dos meus anos.

É hoje, é hoje, eu mais e mais
me encolho; desnascer, porém, não é possível...
Renascer? Eu não sei. Jamais
eu tinha visto em mim estes dedos feridos,
as pústulas nos braços, manchas,
as unhas de meus pés tão longas, como lanças,

e percebido o quanto fere
caminhar. Envelheço, envelheço, envelheço...
Acabrunhado, as minhas pernas
sentem cócegas, pois, cabeça entre os joelhos,
cabelos roçam nelas. Pranto
escorre-me a cobrir-me a face, um fino manto

a escancarar minha tristeza.
Um membro flácido esparrama-se, cansado,
e dorme. As coxas se retesam,
as nádegas sorriem; de onde vem-me ao naso
o doce aroma de meu ânus.
Ó doce aroma, ó doce aroma, o meu aroma,
o qual somente eu sinto e assoma
apenas neste dia, o dia dos meus anos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário